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UDEMO |24/06/14 17:00| Atualizado em 24/06/14 17:05


O que precisa mudar na educação em São Paulo

WALTER VICIONI GONÇALVES

Tornou-se um desgastado lugar comum, no Brasil atual, falar que a educação precisa mudar. De fato, tudo precisa mudar. As instituições, os valores e a cultura precisam de um profundo e duradouro choque de renovação. Nesse tsunami civilizatório, a educação tem lugar essencial na formação e desenvolvimento e novos padrões de convivência e de cidadania.

Não dá para situar a educação exclusivamente como causa ou como efeito de um amplo processo de mudança social. De uma ou de outra forma, a educação sempre funcionará como suporte e instrumento fundamental de uma nova ordem. Nesse sentido, é preciso superar o desgaste e o descrédito de propostas inovadoras em educação. Duas ideias, porém, precisam ficar bem claras e assentadas: primeira, sem mudança em educação não é possível promover e manter uma relevante transformação social e, segunda, as mudanças eficazes em educação são, em geral, simples, profundas e produzem resultados em médio prazo, ou seja, após pelo menos uma década.

Indiscutivelmente, o ponto de partida deve ser a educação básica, que é o sustentáculo da continuidade de estudos, da inserção no mundo do trabalho e do exercício da cidadania, tal como preconiza o artigo 205 da Constituição Federal.
No quadro legal de distribuição de responsabilidades, destaco, neste artigo, a presença e participação do Poder Público Estadual na oferta do ensino fundamental e médio. A situação do Estado de São Paulo, nessa etapa da educação básica, não difere muito das demais unidades da Federação. Numericamente, pode-se dizer que ensino fundamental está universalizado e o médio está próximo disso. A baixa qualidade, entretanto, vem se tornando o grande desafio e a frustração de sucessivos governos nos últimos 30 anos. Os indicadores de avaliação, nacionais e internacionais, evidenciam profundas carências, a começar pelas habilidades básicas de leitura, escrita e cálculo.

Os inúmeros e repetitivos diagnósticos são, praticamente, unânimes em apontar as principais causas desse desastre: a baixa remuneração e consequente desinteresse pela profissão docente, a inadequada formação dos professores e as condições insatisfatórias de funcionamento das escolas.

Para a rede pública estadual de educação básica de São Paulo é preciso, antes e acima de tudo, que um plano de melhoria e expansão seja implantado como política de Estado, independente de partidos, ideologias e governos de plantão. As metas desse plano devem constituir desdobramentos das linhas mestras a seguir.

  • Valorização do professor.

Não se questiona que a qualidade do ensino depende da ação docente. Constitui, portanto, grave problema o desprestígio da carreira do professor. A categoria profissional do magistério não vem recebendo a devida atenção em termos de remuneração e de formação. É preciso implantar uma política de gradual elevação dos salários dos professores, de forma a equipará-los, pelo menos, às categorias profissionais que requerem o mesmo nível de formação e responsabilidade. Não se trata de medida que possa ser posta em prática instantaneamente, pois é preciso viabilizar fontes de recursos. Mas é indispensável que seja realizada, pois constitui requisito essencial para o alcance das demais prioridades. Paralelamente, o governo estadual deve mobilizar esforços junto às instituições de ensino superior no sentido de atualizar e melhorar a formação de professores.

  • Melhoria das condições de funcionamento das escolas.
  • Ampliação da jornada escolar.

A maioria das escolas funciona atualmente com a reduzida carga horária mínima legalmente exigida, ou seja, 25 aulas semanais. É muito pouco para um adequado desenvolvimento de competências requeridas para a vida moderna. Há necessidade de progressiva ampliação da jornada escolar, dando-se prioridade em aulas adicionais e de reforço em língua portuguesa, matemática e ciências. Deverá ser ampliada, gradualmente, a jornada escolar dos alunos para tempo integral no ensino fundamental, começando pelos primeiros anos a partir de 2016. O ensino fundamental estará totalmente em jornada integral em 2024. É preciso salientar que a ampliação da jornada não significa uma simples justaposição de horas a mais para atividades aleatórias descoladas de uma proposta curricular. É necessário, preliminarmente, realizar uma vigorosa reestruturação curricular com aumento da carga horária total e ênfase nos mencionados componentes. Além da base nacional comum, o projeto pedagógico de cada escola deve conciliar todas as atividades educativas com os padrões culturais locais.  As atividades extracurriculares – tais como visitas, viagens, cultura e esportes - também relevantes para a formação integral do educando, continuarão sendo desenvolvidas fora da jornada escolar curricular. Quanto à avaliação do ensino, deve ser efetuado estudo e mudança no sentido de se evitar que ocorra a perversa “pedagogia da repetência” e a nefasta “promoção automática”.

  • Expansão da autonomia da escola.

A autonomia da escola constitui um dos pilares conceituais da LDB. No entanto, observa-se um baixo grau de autonomia das escolas estaduais. É preciso identificar os limites máximos em que essa autonomia pode ser posta em prática na rede pública estadual. Sem dúvida, é possível avançar muito na concepção e execução do projeto pedagógico de cada escola e na descentralização de competências e de uso de recursos.

  • Elevação da eficiência da gestão escolar.

É voz corrente no meio educacional de que cada escola “tem a cara do diretor”. De fato, o diretor é a peça chave na elaboração e execução do projeto pedagógico. Depende dele a motivação e o entusiasmo da equipe de professores e funcionários no cotidiano escolar. Há exemplos significativos de escolas em locais de alto risco ou de elevada carência econômica e social que, pela exitosa atuação do diretor, apresentam excelentes resultados. É preciso disseminar e multiplicar esse tipo de experiência. Há necessidade de constante aprimoramento da gestão escolar, por meio de capacitação e valorização do diretor de escola e demais dirigentes da educação.

As mudanças e melhoria do ensino fundamental devem induzir efeitos benéficos no ensino médio, que, também, deve ser objeto de renovação e reestruturação curricular.

Somente com educação básica de excelente qualidade poderemos falar em formação adequada da pessoa, do cidadão e do trabalhador e, consequentemente, de construção e constante aprimoramento de uma verdadeira sociedade democrática.

SP, 16/06/2014.


Walter Vicioni Gonçalves * - ex – Diretor de Escola Pública, é diretor do SENAI-SP, superintendente do SESI-SP, e membro titular do Conselho Estadual de Educação de São Paulo. É associado da Udemo.

 

 

 

 
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